O trem precisa ser uma bandeira de luta da Paraíba
O novo movimento em defesa da implantação de linha férrea entre Cajazeiras e Cabedelo

Louve-se a iniciativa da Fiep (Federação das Indústrias da Paraíba) de apresentar ao vice-presidente da República, Geraldo Alckmin, que também é ministro da Indústria e Comércio, o pleito de implantação de linha férrea ligando o litoral ao Sertão do Estado.
A apresentação pública da reivindicação, em evento da Fiep com abundante participação de empresários e políticos com poder, sugere que a entidade deverá encampar uma luta organizada em defesa do estratégico projeto do trem interligando o Estado.
Despiciendo dizer que este não pode ser um projeto e uma luta apenas da Fiep. Precisa, obrigatoriamente, ser luta encampada pela política. É dever de todos os políticos abraçar essa ideia de a Paraíba voltar a ter seu território cortado de leste a oeste ou de oeste a leste (como queiram) por linhas ferroviárias.
As novas gerações politicas, em grande parte herdeiras das velhas e tradicionais famílias ou grupos de poder, precisam pagar a imensurável dívida da ignorância, acovardamento e tibieza com que seus ascendentes (nem tão antigos assim) enfrentaram o movimento e iniciativas que resultaram no desmonte das linhas de trem na Paraíba.
Não se desconhece que o equivocado movimento de desmonte do sistema ferroviário nacional era poderoso e visava abrir espaço para a indústria automobilística ali no final da década de 1950, aprofundando-se na duas décadas seguintes. Mas não se pode deixar de responsabilizar a política pela falta de visão e frouxidão de atitude diante da situação, mesmo que tenha sido a ditadura militar, seguindo o que já havia sido traçado pelo poder econômico internacional e local, a arrancar os trilhos e desmontar quase tudo.
O novo movimento em defesa da implantação de linha férrea entre Cajazeiras e Cabedelo vai precisar também de forte envolvimento da sociedade, organizada ou não, porque é possível transformar a ideia numa bandeira de luta popular.
Em qualquer circunstância e em qualquer lugar do mundo, é impensável aceitar o desmonte de uma linha ferroviária. Na Paraíba se aceitou. Na União Europeia e na Ásia o trem de carga é essencial para o desenvolvimento e os modernos trens de ageiros são um espetáculo que interligam todos os lugares rapidamente. Nos Estados Unidos o trem é fundamental para interligar as grandes distâncias. O Brasil optou por descarrilar em seu projeto de desenvolvimento e ficar fora dos trilhos.
Por aqui, tristemente, vigorou e ainda vigora a estupidez. Não havia necessidade de se matar o trem para dar lugar às rodovias e suas carretas, caminhões e automóveis. As alegações que as linhas ferroviárias eram deficitárias não podem ser tomadas como verdadeiras. Na verdade, o governo as abandonou.
A falta de visão política e econômica na Paraíba permitiu desmontar mais de 600 Km de linhas ferroviárias dos 640 Km que conseguiu conquistar entre 1883 e algo próximo a 1950. Hoje, não restam nem 30 Km em utilização. Ainda no Império, a Paraíba ganhou estradas de ferro ligando a Capital a Mulungu, Pilar, Guarabira e Cabedelo. Na República Velha,
O trem chegou a Alagoa Grande, Itabaiana e Timbaúba, em Pernambuco, e Nova Cruz, no Rio Grande do Norte. No governo Epitácio Pessoa (1919/1922), vinda do Ceará, a linha férrea, chegou ao sertão (São João do Rio do Peixe, Cajazeiras, Sousa, Pombal, etc.) assim como se encaminho para o brejo (Bananeiras). Nos seguintes, ganhou o restante da interligação entre o litoral e o sertão. Havia conexão entre os portos de Cabedelo (PB) e Pecém (CE).
No sertão de Cajazeiras, o ex-vice-prefeito e ex-vereador Abdiel Rolim mobilizou amplos segmentos da população para tentar impedir o desmonte da linha de trem, que teve a circulação finalizada em 1965, já na ditadura militar, e os trilhos arrancados em 1970. Completava-se, assim, o horror da cegueira da gestão pública nacional e da incapacidade de mobilização local.
Nem de longe dá para imaginar como um país faz o que o Brasil fez com sua malha ferroviária e, em consequência, mensurar os prejuízos econômicos, sociais e, porque não dizer, civilizatórios.
A bandeira levantada agora pela Fiep, reivindicando nova linha de trem entre o litoral e o sertão, precisa virar uma bandeira de luta de todos, uma bandeira de luta da Paraíba.
Existe viabilidade econômica para justificar o custo do empreendimento? Perguntem aos chineses. Entre 2008 e 2010, durante dois anos, um monte de pesquisadores chineses se instalou em grande casa alugada em Cajazeiras e contratou uma construtora para escavar serras em várias localidades da região. Sumiram com toneladas de sacos de fragmentos de rocha e terra. Não disseram nada, mas vazou que se tratava de pesquisas por jazidas de minério de ferro.
Além disso, o sertão está repleto de projetos de energias renováveis e muita água da transposição do São Francisco, que são base para grandes projetos de desenvolvimento.
Pelo visto, parece que chegou a hora é largar essa política que só olha para os pés.